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Lectio Divina - Abril 2020

Perspectiva Histórica

 

         “Um dia, ocupado no trabalho manual, comecei a pensar no exercício espiritual do homem. E eis que de repente, enquanto refletia, apresentaram-se a meu espírito quatro degraus espirituais: a leitura, a meditação, a oração, e a contemplação.

         Esta é a escada dos monges, que os eleva da terra ao Céu. Embora divida em poucos degraus, ela é de imenso e incrível comprimento, com a ponta inferior apoiada na terra, enquanto a superior penetra as nuvens e perscruta os segredos do Céu. (Gn 28, 12)”.

         Assim temos a sistematização da Lectio Divina em quatro degraus, por volta do ano 1150, quando Guido II, de origem francesa, monge cartuxo, escreveu um livrinho intitulado “A Escada dos Monges”.

         Isto se deu no século XII; hoje, graças amodernas investigações, é possível conhecer os grandes rasgos e sua história.

         O Novo Testamento, por exemplo, é resultado é resultado de leituras que os primeiros cristãos faziam do Antigo Testamento à luz dos seus dos seus problemas e à luz da nova revelação que Deus fez e si através da ressurreição de Jesus. Mais do que buscar informações sobre o passado, a Palavra de Deus lhes clareava o presente com a luz da presença do Deus-conosco: Cristo é Aquele de quem falam as Sagradas Escrituras; Ele é o Centro do Antigo e Novo Testamento.

         Remontando ainda mais, vemos que a leitura divina tem suas raízes na religião judaica: no uso da Sinagoga, na leitura própria dos rabinos e de seus discípulos.

         Orígenes, (*184 +253-254) o sábio mais fecundo da antigüidade cristã, o famoso mestre da Lectio Divina provavelmente aprendeu de seus mestres judeus este método. Entre as práticas ascéticas, Orígenes recomenda vivamente a leitura cotidiana das Sagradas Escrituras (hom. In Gn 10, 3).

         Ler a Sagrada Escritura é, segundo os Santos Padres da Igreja, obrigação principal de todo cristão. A idéia é bem simples: cristão é quem segue Cristo; daí não se conceber cristão ou em termo ainda mais claro: santo sem a escuta da Palavra.

         São João Crisóstomo (*344 +407) indignava-se quando diziam que ler a escritura é coisa de monge. “Não, dizia, é próprio de todos os que se vangloriam de ser cristãos”. Não obstante, a Bíblia estava se convertendo no livro do monge e o monge no homem da Bíblia.

         Cassiano (*360 +435), o grande divulgador da espiritualidade monástica no Ocidente, insiste, seguindo Orígenes, no grande poder da renovação espiritual contida na leitura da Bíblia, não na de seus comentaristas. Em sua Conferência XIV, 10 exorta entre outras coisas: “Depois de haver deixado todos os teus cuidados e todos os teus pensamentos terrenos, esforça-te por aplicar-te assiduamente, ou melhor, constantemente, à leitura Sagrada, tanto que esta meditação contínua impregne finalmente a tua alma e a forme, por assim dizer, à sua imagem”.

         São Bento (*480 +547) no capítulo 48 de sua Regra usa mesmo a expressão “lectio vacare”; trata-se de dedicar ao colóquio com Deus um tempo verdadeiramente livre de toda ocupação. No capítulo 53, 1-9 recomenda que ofereça ao hóspede o pão da Palavra: “Leia-se diante do hóspede a lei Divina para que se edifique...”

         Assim, nos séculos V-VI, a “Lectio Divina”, já institucionalizada nos mosteiros, ocupa um lugar determinado no horário das comunidades. Todos os mestres do monaquismo recomendavam encarecidamente a “Lectio Divina”.

         Os monges da Idade Média permaneceram fiéis á prática da “Lectio”, pelo menos até certo ponto, pois em alguns ambientes ia desvirtuando-se. Podemos falar de decadência?

         No fim do século XII, a expressão “Lectio Divina” tornou-se cada vez mais rara; os escritores modernos encontram uma forma de oração que a suplanta: a oração mental e com ela os diversos livros ensinando métodos. Nesta época de transição, a leitura se converte em um exercício espiritual autônomo não orientado pela oração, sem o rigor exigido na “Lectio Divina” e conseqüentemente, um afastamento da Sagrada Escritura. Esta recupera, esporadicamente um lugar preferencial somente em certos autores e em certos ambientes religiosos. Era também o infeliz efeito da contra-reforma na vida da Igreja. O método do protestantismo fez perder o contato com a fonte.

         Podemos considerar ainda na época de Santa Teresa de Jesus (*1515 +1582) o pouco acesso que se tinha à Sagrada Escritura; sua condição de mulher era também uma lição muito grande. Ela o confessa: “O fato de ser mulher me faz cair as asas” (V 10,8). A Sagrada Escritura estava proibida para o povo, pois as autoridades eclesiásticas temiam que se produzissem danos na fé. Ela mesma nunca teve um exemplar da Bíblia disponível, para lê-lo, estudá-lo e consultá-lo. Melquior Cano, um dos teólogos de seu tempo chegou a escrever: “Por mais que as mulheres reclamem com insaciável apetite comer deste fruto (ler a Sagrada Escritura), é necessário impedi-lo e pôr uma faca de fogo, para que o povo não chegue a ele”. (Cit. por M. Andrés, La teologia española em siglo XVI, 11, BAC)

         “A Esposa do Verbo Encarnado, a Igreja, guiada pelo Espírito Santo sempre se esforçou por conseguir uma maior e mais profunda inteligência das Sagradas Escrituras, para poder alimentar continuamente os seus filhos com as palavras divinas” (DV23). Prova disto são as encíclicas Providentissimus Deus de Leão XIII, Spiritus Paraclitus de Bento XV, Divino Afflante Spiritu do Papa Pio XII da qual destacamos os parágrafos 9, 26 e 29 – isto para não mencionar todasa as exortações da Santa Igreja.

         O Concílio Ecumênico Vaticano II, porém, em sua Constituição Dogmática Dei Verbum 25, ratificou e promoveu ainda mais, com todo o peso de sua autoridade, a restauração da “Lectio Divina”. O concílio fez voltar à centralidade da Palavra exortando com ardor e insistência a todos os fiéis cristãos, especialmente os religiosos, que, pela freqüente leitura das Divinas Escrituras, alcancem este bem supremo: “Tenham todos os dias em mãos a Sagrada Escritura, para aprenderem, pela leitura e meditação dos Divinos textos, ‘a ciência eminente de Jesus Cristo’ ”.

         “Viver em meio destas coisas, meditá-las, não saber mais nada, nem mais nada procurar, não vos parece que é já, estando ainda na terra, morar no Céu?” (S. Jerônimo, Ep, 53, 10; PL XXII)

         A este respeito torna-se útil citar ainda documentos mais recentes como a Carta Apostólica “Novo Millenio Ineunte”, 34;39; “Partir de Cristo” III, 24.

         Assim, sempre no “hoje” do tempo favorável da graça, somos introduzidos na força misteriosa da Palavra Divina, que se realiza, se faz acontecimento em nós – a mesma Palavra Divina – JESUS CRISTO- que temos escutado.

 

Lectio Divina - Março 2020

Perspectiva Teológica

 

         “A Igreja sempre venerou as Divinas Escrituras, da mesma forma como o próprio Corpo do Senhor, já que, principalmente na Sagrada Liturgia, sem cessar, toma da mesa tanto da Palavra de Deus quanto do Corpo de Cristo, o Pão da Vida, e o distribui aos fiéis.” (Dei Verbum 21)

         O Concílio Vaticano II ainda em seu decreto “Dei Verbum”, 25 ratificou e promoveu com tanto peso de sua autoridade, a restauração da “Lectio Divina”: “Lembrem-se porém, que a leitura da Sagrada Escritura deve ser acompanhada pela oração, a fim de se estabeleça um colóquio entre Deus e o homem. Pois ‘com Ele falamos quando rezamos, e Ele ouvimos quando lemos os Divinos oráculos’ “. (Stº Ambrosio)

         Incentiva a irmos ao texto sagrado, quer pela Sagrada Liturgia, repleta da Divina Palavra, quer pela piedosa leitura, quer por cursos apropriados e outros meios que, com a aprovação e o empenho dos Pastores da Igreja, hoje em dia louvavelmente se difundem por toda a parte. O estudo está, porém, ao serviço da Lectio Divina, não a substitui. Será, de fato, como conhecer todas as qualidades de um alimento, mas não comê-lo, não experimentar-lhe o sabor e a eficácia nutritiva.

         Na tradição cristã, o diálogo com Deus tem dois tempos: a leitura e a oração. A Lectio Divina, que significa leitura orante, “leitura de Deus”, é também a “arte de estudar deus” segundo a harmoniosa definição de São Gregório Magno, o que significa algo inesgotável, pois a Deus nunca vamos acabar de ler.

         “Sejam as tuas Escrituras a minha casta delícia!” Assim rezava Santo Agostinho deixando cair como “escamas” toda a vã ciência da qual estava por muitos anos engolfado. Mas isto o conseguiu só quando decidiu deixar-se verdadeiramente converter pela Palavra de Deus.

         Se escutar uma pessoa significa acolhê-la, escutar o Senhor significa dar crédito a Ele e aderir incondicionalmente à Sua Palavra. Como aos profetas da Antiga Aliança, hoje também a nós é mandado “comer o Livro” e assimilá-lo, sermos “servos da Palavra” segundo a bela expressão da Instrução Partir de Cristo, 24. Trata-se de um passivo e ativo, tendo disto o senso da fé, dispondo Àquele que fala o ouvido do coração todo envolto de reverente amor e resoluta deliberação em consentir prontamente, isto é, a tornar-se lugar em que cada Palavra Sua se faça ato vital.

         Para que a leitura de Deus seja autêntica, é preciso ir com espírito de entrega, de perfeita disponibilidade ao que o Senhor vai nos pedir. Tal foi a disposição interior da Virgem de Nazaré quando ao anúncio do Anjo, a Palavra nela se fez Carne. Lembramos aqui a bela expressão de nosso irmão carmelita descalço, Rafael Kalinowisk: “Maria é o livro onde o mundo pode ler o Verbo de Deus”.

         Lectio Divina é um trabalho de larga duração, que leva a uma profunda incessante, mas normalmente impermeável, de nossa intimidade com Deus. Por isso São João Crisóstomo orava diante da Bíblia: “Senhor Jesus Cristo, abre os olhos de meu coração...ilumina meus olhos com tua luz..., Tu somente és a única luz”.

         Para muitos a linguagem da Bíblia ainda não é imediatamente compreendida. Uma iniciação adequada faz-se necessário, levando em conta o seu sentido histórico e literal; o sentido alegórico ou tipológico; o sentido antropológico ou moral e o sentido anagógico ou místico. Assim se tem uma leitura contemplativa da Bíblia e, em conseqüência, uma “teologia espiritual” que alimenta as nossas vidas. Fazendo isto, constatamos que cada Palavra da Sagrada Escritura, é inédita, é sempre como revelada de novo.

         Um dos segredos de santidade de Santa Teresa do Menino Jesus, talvez o principal, era a sua plena aceitação da palavra de Deus para realizá-la e vivê-la. Jamais tentou acomodá-la a seu caminho, mas acomodou o seu caminho à Palavra de Deus, de um modo total e absoluto.

         Da Palavra ouvida à Palavra vivida: este é o itinerário para cada um de nós. Deve fazer brotar em nossos corações o desejo da partilha e abrir-nos aos irmãos e irmãs na caridade fraterna e fazendo-nos crescer no senso comunitário. “Com minha vida - dizia São Nilo - interpreto toda a Escritura”.

         “A santidade não é concebível senão a partir de uma renovada escuta da Palavra de Deus. ‘De modo particular_ lemos na Novo Milennio Ineunte_ é necessário que a escuta da Palavra se torne um encontro vital...[que] permite ler o texto bíblico como Palavra viva que interpela, orienta, plasma a existência’. É lá, com efeito que o Mestre se revela, educa o coração e a inteligência. É lá, que amadurece a visão da fé, aprendendo-se a olhar a realidade e os acontecimentos com o mesmo olhar de Deus, até se chegar a ter o ‘pensamento de Cristo’”. (ICor 2, 16) (Partir de Cristo, 24). E prossegue: “A Palavra de Deus é alimento para a vida, para a oração e para o caminho diário...”

         Os quatro degraus da “Lectio Divina” são Leitura, Meditação, Oração e Contemplação. Trata-se de um processo dinâmico de leitura, em que várias etapas nascem uma da outra.

         A Leitura é o ponto de partida, não é o ponto de chegada. Prepara o leitor e o texto para o diálogo da meditação. O seu objetivo é ler e estudar o texto até que ele, sem deixar de ser ele mesmo, se torne espelho e nos reflita algo de nossa própria experiência de vida.

         Rompe a distância entre o ontem do texto e o hoje da nossa vida, a fim de poder iniciar o diálogo com Deus na meditação.

         Sendo a “Lectio Divina” uma leitura orante, supõe a fé. Ela é a certeza de um encontro. Devemos ler, reler, voltar a ler; como carta desejada, não nos contentarmos com uma leitura só, e sabemos até ler entrelinhas. Hoje isto se torna um desafio. Vivemos numa época de dispersão, de imagens; faz-se necessário toda uma aprendizagem e uma ascese.

         Sentindo-nos penetrados dos mesmos sentimentos em que foi escrito o texto, aí, como que de repente, damo-nos conta de que por meio dele, Deus está querendo falar conosco e nos dizer alguma coisa. É nesse momento que a leitura se transforma em meditação.

         Dentro da dinâmica da “Lectio Divina” a Meditação ocupa um lugar central.

         Uma das formas é repetir o texto, ruminá-lo até descobrir o que ele tem a nos dizer. A ruminação da Palavra de Deus comunica sabedoria de vida, vai exigindo que nos tornemos uma expressão da Palavra ouvida e meditada. “Não ressoe em nossos ouvidos sem deixar marcas, sem que se grave em nossos corações”. (São Gregório Magno, Mor 16, 35,43)

         Cassiano aponta um aspecto importante da meditação; “Instruídos por aquilo que nós mesmos sentimos, já não percebemos o texto como algo que só ouvimos, mas como algo que experimentamos e tocamos com nossas mãos; não como história estranha e inaudita, mas como algo que damos à luz desde o mais profundo do nosso coração, como se fossem sentimentos que formam parte de nosso próprio ser”.

         A meditação é semente da Oração, que seria o terceiro passo, embora esta atitude esteja presente desde o começo da “Lectio”.

         A Oração, provocada pela meditação, inicia-se por uma atitude de admiração silenciosa e de adoração ao Senhor. É então que damos a nossa resposta à Palavra de Deus.

         Só a experiência pode fazer-nos reconhecer o encontro com Deus. Que se pode dizer do fogo, quando se dentro dele?

“O aspecto mais sublime da dignidade humana está nesta vocação do homem à comunhão com Deus”; conforme o nº 19, 1 da Gaudium Spes. E ainda: “Este convite que Deus dirige ao homem, de dialogar com Ele, começa desde a existência humana”.

         Há várias formas de Orar. Pode-se recorrer ao uso dos salmos. No dizer de Santo Agostinho, “Jesus é o grande cantor dos salmos.” Ele os usou freqüentemente.

         A resposta a Deus pode ser de louvor ou ação de graças, de súplica ou de perdão. Ou simplesmente, segundo a rica expressão de nossa Santa Madre Teresa de Jesus, “A meu parecer, não é outra coisa a oração mental, senão um tratar de amizade com Aquele que sabemos nos ama”. E Santa Teresinha do Menino Jesus: “Para mim, a oração é um impulso do coração, é um simples olhar lançado ao Céu, um grito de reconhecimento e amor no meio da provação ou no meio da alegria”.

         E a Contemplação, qual o momento em passarmos para ela? Não há resposta. A Contemplação é o que sobra nos olhos e no coração, depois que a oração termina.

         A Contemplação fica para além do caminho da “Lectio Divina”, pois é o seu ponto de chegada. Não se trata de formar conceitos, mas de estar com o Senhor; é também capacidade de perceber a presença de Deus em tudo, nos acontecimentos, na história, nos outros. É, no encontro de um amor pessoal, uma experiência de Deus que se revelou e nos salvou a fim de nos fazer participar do diálogo do Pai e do Filho e do Espírito Santo.

         Esta presença unifica os cacos da vida. Antecipa algo da alegria que “Deus preparou para aqueles que o amam”. (ICor 2,9)

         Sigamos, pois o conselho do grande S. Bernardo: “Guarda, pois, a Palavra de Deus, porque são felizes os que as guardam; guarda-a de tal modo que ela entre no mais íntimo de tua alma e penetre em todos os teus sentimentos e costumes. Alimenta-te deste bem e tua se deleitará na fartura. Não esqueças de comer o teu pão que teu coração não desfaleça, mas que tua alma se sacie com este alimento saboroso. Se assim guardares a Palavra e Deus, certamente ela te guardará. Virá a ti o Filho em companhia do Pai, virá o Grande Profeta e renovará Jerusalém e fará novas todas as coisas. Graças a essa vinda, como já refletimos a imagem do homem terrestre, assim também refletiremos a imagem do homem celeste. (ICor 15,49)” (Sermões de S. Bernardo, abade)

(Texto: Monjas Carmelitas – Carmelo de Santos/SP)

 

Lectio Divina - Fevereiro 2020

Perspectiva Bíblica

 

                “Nom minus est Verbum Dei quam Corpus Chisti.” “Não é menor a Palavra de Deus que o Corpo de Cristo.” (Stº Agostinho)

         Deus é Palavra; a mensagem que a Bíblia nos comunica é uma espécie de Sacramento da Presença do Senhor. Antes de fazer-se Carne, o Verbo se fez Escritura. Depois da Encarnação do Verbo a escuta da Palavra tornou-se em sentido pleno Comunhão, Eucaristia, Deus-conosco. Assim devemos nos preparar com pio recolhimento a alimentação que, maná cotidiano, a Sagrada Escritura nos traz - seja na Liturgia das Horas, seja na Liturgia diária da Missa, na oração pessoal ou no estudo -, da mesma sorte como nos concentramos na prece, antes da Comunhão e nos manter numa atmosfera celeste de uma fervorosa impregnação da Palavra.

         De fato “nós bebemos o Sangue de Cristo não somente quando o recebemos segundo os ritos dos Sagrados Mistérios, mas ainda quando recebemos a Sua Palavra onde está a Vida, como Ele disse de Si mesmo: “A palavra que vos disse, são espírito e vida.” (Orígenes)

         Interiorização da Palavra como o sangue nas veias, onde já nem parece haver mais diferença entre Bíblia e vida, entre palavra de Deus e a nossa palavra: a vida ilumina o texto, o texto ilumina a vida. É uma tomada de consciência de que em nossa vida se prolonga a história Sagrada.

         Para tal, ressaltamos a importância dos meios ascéticos que o Carmelo nos apresenta, não no prisma de renúncia, mas porque melhor nos dispõem ao escopo da “Lectio Divina”, essencialmente aquele de entrar em íntima comunhão com Deus, viva experiência de amor, “estando muitas vezes a sós com quem sabemos que nos ama”. (Stª Teresa de Jesus, Vida, 8,5)

         Não se trata, portanto, de acrescentar algo à nossa vida, mas estarmos despertas na fé, com ouvidos de discípulo, criando “espaço sagrado”, para a Palavra de Deus.

         Movidas não pela erudição, mas por um apaixonado amor, aí vamos procurar a “ciência eminente de Jesus Cristo” (Fl 3,8), pois “há muito que aprofundar em Cristo, sendo Ele qual abundante mina com muitas cavidades cheias de ricos veios, e por mais que se cave, nunca se chega ao termo, nem se acaba de esgotar”. (S. João da Cruz- Cântico Espiritual, 37, 4)

         A Bíblia não é um livro, mas uma Pessoa: Cristo Jesus; Ele é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim; somente a Sua Pessoa dá sentido e harmonia a toda a História Sagrada. “Todas as promessas de Deus são um sim em Jesus Cristo” (II Cor 1,20).

         A Lectio Divina nos compromete com a Comunidade; “sentimos ser aí o espaço teologal, onde se experimenta a presença mística do Senhor Ressuscitado” (Verbi Sponsa 1,6) e à maneira dos primeiros cristãos vamos partilhar a Palavra com espontaneidade, num clima de fraternidade e simplicidade evangélica.

         “Afastadas das coisas externas na intimidade do ser, purificando o coração e a mente através de um sério caminho de oração, de renúncia, de vida fraterna, de escuta da Palavra de Deus, de exercício de virtudes teologais, somos chamadas a conversar com o Esposo Divino Meditando a sua lei dia e noite, a fim de recebe o dom da sabedoria do Verbo e tornar-se uma só coisa com Ele, sob o impulso do Espírito Santo”. (Verbi Sponsa 1,5)

         Sentimo-nos felizes, pois, Monjas Contemplativas, “revivemos e continuamos na Igreja a presença de Maria. Acolhendo o Verbo na fé e no silêncio adorador, colocamo-nos ao serviço do mistério da Redenção.” (Verbi Sponsa 1,4)